Brian Fagan
A citação acima e o texto abaixo foram extraídos do livro “O Aquecimento Global – a influência do clima no apogeu e declínio das civilizações”, do antropólogo britânico Brian Fagan (São Paulo: Larousse do Brasil, 2009).
Como os agricultores de subsistência atuais, os do ano de 1200 não deixavam que nada se perdesse, mesmo em um ano bom como esse. Basta observar as rugas profundas que marcam o rosto dos adultos para entender. Até os homens e mulheres na casa dos 20 anos parecem velhos, as fisionomias debilitadas pelo trabalho e pela fome ocasional ou pela má alimentação. Contudo, essas pessoas viviam em um mundo mais quente do que fora por muitos séculos, que os climatologistas chamam de Período de Aquecimento Medieval.
Mil anos atrás, tudo na Europa dependia da agricultura. Da Inglaterra e Irlanda até a Europa Central,
Havia muito menos gente, então. A população de Londres ultrapassava a casa dos 30 mil habitantes pela primeira vez em 1170. As populações conjuntas da França, Alemanha, Suíça, Áustria e Holanda somavam aproximadamente 36 milhões de pessoas em 1200, e hoje somam mais de 250 milhões. Quase todas essas pessoas viviam em aldeias e vilarejos, ou talvez cidades pequenas, pois as grandes cidades estavam apenas começando a ser um elemento significativo na vida européia. E todos, até mesmo o “grande senhor”, dependiam de uma zona rural cultivada sem máquinas, sementes híbridas ou fertilizantes. Cavalos e bois, e até as esposas, puxavam o arado e o rastelo. A colheita era reunida com as mãos, carregada nas costas das pessoas, talvez transportada até o mercado por uma carroça puxada por bois ou por barcaças.
Londres medieval
Cada agricultor sabia que a terra cultivável precisava ser arada e fertilizada por animais, e depois descansar para recuperar sua fertilidade e minimizar a ocorrência de pragas nas plantas. Os solos mais leves, com melhor irrigação, recebiam as plantações de cereais. Os animais se alimentavam nos bosques e em pasto aberto nos solos mais pesados, argilosos. Sua única proteção contra as secas, tempestades ou geadas repentinas era uma plantação mais diversificada, baseada muito mais em variedades, além dos cereais.
Ganhar a vida com o solo medieval europeu nunca foi tarefa fácil, mas era o que se fazia e, às vezes, com sucesso considerável, especialmente durante os verões mais quentes e secos. Os agricultores da Inglaterra e França cultivavam principalmente trigo, cevada e aveia. Ervilhas e feijões, ricos em vitaminas, eram plantados nos campos no início da primavera e colhidos no outono; os legumes ficavam nas plantas até secarem, e os caules eram plantados de volta como fertilizantes. Legumes e hortaliças de todos os tipos completavam o que era basicamente uma dieta sem carne, à base de pão e mingau.
A maioria dos agricultores tinha uma pequena criação de animais – uma ou duas vacas leiteiras, alguns porcos, ovelhas, cabras e galinhas e, os que tinham sorte, um cavalo ou alguns bois, ou pelo menos acesso a eles para arar. Os animais forneciam carne e leite, e também as peles e a lã.
Todo ano, enquanto o verão amadurecia para dar lugar ao outono, cada comunidade fazia sua colheita e agradecia a Deus pela generosidade, pois a vida não era fácil. O interminável ciclo das estações definia a existência humana. Assim como a rotina da semeadura, o desenvolvimento da plantação e a colheita; a realidade do nascimento, vida e morte; e todos acreditavam que esses eram os desígnios arbitrários do Senhor.
Em uma era muito anterior à da previsão do tempo, todos, fossem reis ou nobres, senhores de guerra, mercadores ou lavradores, estavam à mercê dos ciclos em que se alternavam chuvas pesadas e períodos de seca, tempestades violentas e dias perfeitos de verão. Eram parceiros involuntários em uma dança climática intrincada conduzida pela atmosfera e pelos oceanos. Mas, especialmente entre os anos 800 e
As mudanças de temperatura relativamente pequenas desses séculos são mínimas quando comparadas àquelas do fim da última Idade do Gelo. Cerca de 12 mil anos atrás, o mundo entrou em um período de aquecimento global prolongado, conhecido pelos geólogos como holoceno, que continua até hoje. Gerações de cientistas, trabalhando com dados inadequados, criaram imagens de mais de dez milênios de clima basicamente moderno, com mudanças relativamente pequenas desde o aquecimento que se seguiu à era do gelo. Mas uma revolução na paleoclimatologia transformou nosso conhecimento do holoceno nos últimos anos. Podemos agora discernir, não apenas oscilações de inverno e verão de um milênio atrás, mas também ciclos muito mais curtos, principalmente nos últimos dois mil anos. Algumas mudanças climáticas duram um século ou uma década; outras, como os fenômenos causados pelo El Niño, não duram mais do que aproximadamente um ano.
Poucos acontecimentos climáticos importantes permaneciam por períodos maiores do que uma geração e, por isso, eram rapidamente esquecidos em épocas em que a expectativa de vida era de pouco mais de trinta anos. A nova climatologia nos mostrou que o relógio climático pode acelerar ou diminuir a velocidade, recuar ou mudar de direção subitamente e, até mesmo, permanecer estável por longos períodos de tempo, mas ele nunca para.
Ninguém sabe exatamente o que move o pêndulo climático. É bem provável que pequenas mudanças na inclinação da Terra provoquem alterações no clima, assim como os ciclos de atividade solar. Nos últimos anos, entretanto, a maioria dos climatologistas passou a acreditar que interações complexas, embora ainda pouco compreendidas, entre a atmosfera e o oceano desempenham um papel muito importante nas alterações climáticas.
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