quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Quanto vale a água?

Em quantidade e qualidade a situação da água no mundo é crítica; a quantidade é comprometida pela expansão da agricultura irrigada e, a qualidade, pela urbanização não planejada e a industrialização desenfreada.

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A água é vital para nosso planeta, desde o surgimento dos primeiros organismos unicelulares, há 3,5 bilhões de anos.

O sistema de águas da Terra – a hidrosfera – é um “sistema fechado”, i.é., o volume de água em circulação na atmosfera e na superfície terrestre é sempre o mesmo.

Como ensina o doutor em bioquímica e professor da Universidade de Oxford, Art Sussman, “um copo cheio de água contém mais de dez milhões de moléculas de água que um dia passaram pelo corpo dos nossos ancestrais africanos e dos dinossauros”.

Sussman define o ‘ciclo das águas’ como um processo permanente “que há milhões de anos alimenta e retro-alimenta a água no Planeta”.

Na natureza, a água muda de estado constantemente. Evapora com o aumento de sua temperatura e condensa ou congela quando esfriada. Em sua forma mais utilizável pelo homem, a água líquida flui das áreas altas para as mais baixas, por ação da gravidade.

A água evaporada transforma-se em nuvens e retorna à superfície por precipitação (chuva ou neve). Cerca de 30% de toda essa água doce é armazenada na crosta terrestre, e contribui para o ciclo das águas pela ação das plantas e dos seres humanos.

A maior parte (90%) da água absorvida pela vegetação é devolvida à atmosfera por evaporação e transpiração. Já no corpo humano, a água tem papel fundamental no seu metabolismo, e constitui 70% da matéria que compõe nosso organismo.

Assim como as plantas, os seres humanos participam ativamente do ciclo das águas; cada habitante elimina diariamente, em média, dois litros de água, por respiração (15%), transpiração (20%) e pelas fezes e urina (65%).

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Estima-se que todas as formas de consumo humano somadas respondem por mais de 90% da água limpa disponível na Terra.

Mas a sobrevivência humana e outras necessidades de uso doméstico demandam pouco menos de 1% de toda a água limpa do planeta; a agricultura é responsável por 70% e a indústria por 22% do total dessa água. Os dados são da World Health Organization.

Cerca de 71% da superfície terrestre  é coberta por água. Mais de 97% dessa água está nos oceanos, é salgada e, portanto, de difícil aproveitamento. O restante, a parcela de água doce, está nas calotas polares, geleiras, rios e lagos, mas apenas menos de 1% dela pode ser usada para o consumo humano.

Esses números falam por si só e mostram a importância desse recurso natural para a manutenção da vida, para garantir a sobrevivência humana. E nos coloca uma questão fundamental: qual o valor da água?

Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, “todo ser humano tem direito à vida”; portanto, por ser essencial à vida, a água é também um direito humano e, consequentemente, um bem comum.

Para a jornalista ambiental Liana John, “se a água é um direito humano e um bem comum, a tarefa de cuidar da água deve ser compartilhada e monitorada por todos, cujos bons resultados beneficiam a todos”.

Em quantidade e em qualidade, a situação da água no mundo atual é crítica. Se por um lado a expansão da agricultura irrigada compromete a quantidade de água disponível para o consumo humano, por outro lado, a urbanização não planejada e a industrialização desenfreada promovem uma degradação na qualidade da água.

A ação antrópica, especialmente a partir da revolução industrial, significou a execução generalizada de projetos de grande impacto ambiental, que resultaram na poluição de rios e lagos e no assoreamento dos cursos de água, causados pela devastação das matas ciliares.

Alguns dos maiores rios do planeta não alcançam mais o mar, devido à ação humana ao longo de suas margens, que criou desvios no seu curso e drenou sua vazão.

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Em relação à disponibilidade de água, o Brasil é um país privilegiado: nosso território detém 13% de toda a água doce do planeta.

Dispomos da maior bacia hidrográfica – a Bacia Amazônica – e do maior rio (em volume e extensão) do mundo, o Amazonas. Nossas doze bacias hidrográficas abrangem 55 mil quilômetros de rios, que juntos produzem uma vazão de 5.600 km³ por ano.

O Brasil dispõe também de um gigantesco reservatório de águas subterrâneas, de 112.000 km³, sem falar nas vastas planícies inundadas (o Pantanal) e áreas úmidas de superfície.

Se por um lado a água é abundante em nosso país, sua distribuição está longe do ideal, o que faz com que milhões de brasileiros ainda sofram com a falta de água de qualidade para suprir suas necessidades básicas.

A região amazônica concentra 80% de nossas águas, mas lá vivem apenas 5% dos brasileiros. Regiões populosas como o Nordeste ainda sofrem com a falta de água, pela escassez de chuvas.

Mas não se pode simplesmente “responsabilizar” essa distribuição não uniforme da água em território nacional, pela falta de água limpa para grande parte da população. Atualmente, 2/3 de 430 municípios brasileiros que concentram 94 milhões de habitantes e 70% do PIB requerem investimentos para garantir a oferta de água até 2025.

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Conforme afirmam os estudiosos Liana John e Pyr Marcondes, “só programas inteligentes e comprometidos de gestão da água podem mudar esse cenário e contribuir para um equilíbrio na oferta da água às populações, para os seus mais diversos usos”.

O World Water Council aponta os caminhos que podem levar a uma gestão mais produtiva da água, como também permitir uma reversão dos processos degradantes em curso.

São sete recomendações: 1) limitar a expansão da agricultura irrigada; 2) aumentar a produtividade da agricultura (produzir mais com menos água); 3) aumentar o armazenamento; 4) fomentar a cooperação em bases internacionais; 5) valorizar as funções dos ecossistemas na geração e na renovação da água; 6) estimular a inovação na produtividade da água; e 7) modificar a gestão no uso da água (cobrança, por exemplo).

Esse último ponto envolve a criação e a consolidação de instituições, como os comitês de bacias hidrográficas.

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No Brasil, os comitês da bacia do rio Paraíba, que abrange São Paulo, Rio e Minas e da bacia dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (SP e MG) – Bacias PCJ – foram as primeiras a aprovar a cobrança pelo uso de suas águas.

De acordo com Vicente Andreu, diretor-presidente da ANA (Agência Nacional de Águas), em 2009 o comitê das Bacias PCJ arrecadou R$ 17 milhões, que foram totalmente investidos em programas de recuperação dos rios que formam essas bacias. Parece muito? É pouco, muito pouco. Veja os valores cobrados, conforme o tipo de uso:

R$ 0,01 por m³ captado; R$ 0,02 por m³ consumido; R$ 0,015 por m³ em caso de transposição; e R$ 0,10 por quilo de material orgânico despejado nos rios, no conceito de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio), i.é., quantidade de matéria orgânica por unidade de volume de água. “Os valores são ainda muito baixos”, admite Andreu.

Mais informações sobre cobrança pelo uso de água via comitês de bacias no Brasil podem ser encontradas no livro “O valor da água - Primeiros resultados da cobrança nas Bacias PCJ” (São Paulo: Camirim Editorial, 2010), de Liana John e Pyr Marcondes. 

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