segunda-feira, 21 de junho de 2021

Biodiversidade e clima são dois lados da mesma moeda e devem ser foco do mesmo combate, alertam IPBES e IPCC em parceria inédita

Principais instâncias científicas mundiais sobre biodiversidade e mudança climática advertem sobre perigo de ações centradas no clima impactar ecossistemas e vice-versa

https://www.ipbes.net/sites/default/files/2021-06/20210609_workshop_report_embargo_3pm_CEST_10_june_0.pdf

Pela primeira vez, a Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Ecossistemas (IPBES) da ONU e seu homólogo para o clima (IPCC) realizaram um trabalho conjunto, que durou cinco anos.

No relatório Biodiversity and Climate Change, publicado no último dia 10, cientistas da IPBES e do IPCC acenderam a luz amarela do “semáforo da encruzilhada ambiental”, alertando para o risco de um iminente ponto de inflexão global.

Enquanto as políticas nacionais e internacionais tendem a compartimentar a luta contra a mudança climática e a preservação da biodiversidade, “nenhum desses desafios será resolvido com sucesso se não forem abordados conjuntamente”, diz o texto síntese do estudo que reuniu cinquenta especialistas.

O conteúdo do documento servirá de suporte para estudos do IPBES sobre as interconexões entre biodiversidade, água, alimentos e saúde no contexto da mudança climática, e fornecer subsídios para uma nova avaliação do IPCC, que constará de seus próximos relatórios.

A visão geral da relação entre biodiversidade e clima inclui: (a) impactos e riscos de plausíveis mudanças climáticas, conforme o cenário (+ 1,5 oC, 2 oC, 3 oC e 4 oC em 2100) sobre a biodiversidade terrestre, de águas doces e marinhas, e a contribuição da natureza para a qualidade de vida; (b) feedback de possíveis alterações da biodiversidade sobre o clima; (c) uso do conhecimento científico e autóctono; (d) oportunidades, desafios e riscos do clima alterar as opções de mitigação e adaptação da biodiversidade; (e) impacto da conservação da biodiversidade e de práticas sustentáveis nas emissões deletérias; (f) avaliação de sinergias e políticas compensatórias voltadas simultaneamente para mitigar mudanças climáticas e perdas de biodiversidade, inclusive em áreas urbanas; e (e) principais incertezas científicas.

Durante muito tempo, clima e biodiversidade eram vistos como duas coisas apartadas, diz a especialista em ecologia humana Pamela McElwee, professora da Universidade de Rutgers (EUA), uma das autoras do estudo. “As políticas também seguiram esta visão; progressivamente, o clima ganhou mais importância porque seus efeitos são evidentes. Por exemplo, o fogo na Austrália parece mais distante, mas está estreitamente ligado à questão climática”, explica McElwee.

Trata-se na verdade de um ciclo vicioso. A seca favorece a queima de florestas, que liberam CO2 na atmosfera, amplificando por sua vez o aquecimento global. “Políticas ambiciosas de redução de emissões permitem proteger a biodiversidade, e a regeneração da natureza atenua a mudança climática”, resume o professor Hans-Otto Pörtner, vice-presidente do comitê científico.

Esses dois desafios devem ser encarados em sinergia, uma vez que ações visando combater mudanças climáticas podem prejudicar a natureza e vice-versa. Por exemplo, a compensação de carbono, uma estratégia amplamente adotada por empresas, que consiste a plantar árvores para criar sumidouros de carbono, pode favorecer a substituição de florestas de múltiplas espécies por uma monocultura mais frágil.

“As florestas de plantação podem ser um desastre, já que são extremamente vulneráveis à seca e aos parasitas”, adverte a bióloga Camille Parmesan, professora da Universidade de Plymouth (Reino Unido) e coautora do estudo conjunto IPBES-IPCC. Um outro exemplo são certas tecnologias de energia renovável baseadas em metais raros, cuja exploração pode ser catastrófica para o meio ambiente, lembra Parmesan.

Outro coautor do trabalho, o biólogo Peter Smith, expressa otimismo ao afirmar que são muitas as soluções existentes. “A primeira coisa a ser feita é preservar os ecossistemas, principalmente aqueles ricos em carbono e biodiversidade, como florestas e manguezais”, diz Smith.

O relatório do IPBES-IPCC destaca que a diminuição do desmatamento e da destruição de florestas pode contribuir para reduzir as emissões antrópicas de gases de efeito estufa em até 5,8 gigatoneladas de CO2 equivalente por ano. Uma contribuição significativa, já que em 2019 as emissões mundiais somaram 43,1 gigatoneladas de CO2 equivalente.

Outra ação centrada na natureza, considerada pelos pesquisadores como a mais eficaz e econômica para mitigar a mudança climática, é a restauração de ecossistemas degradados. Mas deve ser urgente, haja vista a velocidade da devastação: desde o início da civilização, o mundo já perdeu metade de suas florestas e de seus recifes de corais.

“Uma sociedade sustentável precisa de um clima estabilizado e de ecossistemas saudáveis. No entanto, 77% da terra (excluindo a Antártica) e 87% da superfície dos oceanos foram modificados por ação direta do homem. Essas alterações estão associadas à perda de 83% da biomassa de mamíferos e de 50% das plantas. Pecuária e humanos ocupam 96% da biomassa de mamíferos da Terra. A quantidade de espécies ameaçadas de extinção nunca foi tão alta em toda a história da humanidade”, diz o texto dos especialistas da IPBES e do IPCC.  

Fontes: https://www.ipbes.net/sites/default/files/2021-06/20210609_workshop_report_embargo_3pm_CEST_10_june_0.pdf

https://www.novethic.fr/actualite/environnement/biodiversite/isr-rse/la-lutte-pour-le-climat-et-la-biodiversite-doivent-aller-de-pair-alertent-le-giec-et-l-ipbes-dans-une-premiere-collaboration-149888.html

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