quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Qual o impacto de aerossóis sobre o clima?

Maior parte dos aerossóis atenua aquecimento planetário, mas seu impacto dura pouco, comparado ao efeito estufa de origem antrópica

https://www.youtube.com/watch?v=lGNCrfKG7iM

Há muito tempo se sabe que os chamados “gases de efeito estufa” aquecem a atmosfera, por meio de um mecanismo similar ao que ocorre dentro de um carro fechado quando seus vidros são expostos ao sol.

Mas, o que dizer dos aerossóis, partículas em suspensão no ar, liberadas por atividades naturais e humanas? Que outro efeito, além da poluição ambiental, exercem sobre a atmosfera? Contribuem para aumentar ou para reduzir o aquecimento global?

Poluentes atmosféricos trazem sérias consequências sanitárias e climáticas; alguns deles, na forma de partículas finas -os aerossóis-, agem simultaneamente sobre a saúde humana e o clima. Refletem parte dos raios solares de volta ao espaço, impedindo que esta parcela da radiação solar atinja a superfície terrestre.

Aerossóis atuam também como núcleos de condensação do vapor d’água, permitindo, assim, a formação de nuvens. Esses dois efeitos combinados são, portanto, benéficos para o clima porque provocam o resfriamento da atmosfera.

No entanto, é relativamente recente a compreensão da ciência sobre a influência dos aerossóis no aquecimento climático de origem antrópica. Antes de abordar os efeitos desses componentes no clima, porém, segue uma breve história do conceito de “efeito estufa”, que remonta há quase 200 anos.

Em 1824, o matemático francês Joseph Fourier, a quem se deve o primeiro esboço da teoria do efeito estufa, já intuía que os gases presentes na atmosfera contribuíam para o aquecimento planetário.

Já em 1860, o físico irlandês John Tyndall designa o vapor d’água e o gás carbônico como principais responsáveis deste fenômeno atmosférico. Até que, em 1896 o físico-químico sueco Svante Arrhénius descreve o efeito estufa tal como conhecemos hoje e que explicamos brevemente a seguir.

Toda energia que permite a vida na Terra tem sua origem no Sol. É a interação dos raios solares com a camada atmosférica que define a quantidade de radiação solar que atinge a superfície do globo.

Em números redondos, 51% da energia solar atravessa diretamente a atmosfera, mesmo na presença de nuvens, e são absorvidos pela superfície terrestre, enquanto 20% são retidos na própria atmosfera.

Os 29% restantes são refletidos de volta ao espaço pelos componentes do ar, por nuvens claras e pelo solo, água e vegetação, mas principalmente nas regiões polares, cuja cobertura de neve é altamente refletora. Esta propriedade, de uma superfície refletir os raios solares, se chama “albedo”.

A superfície da Terra uma vez aquecida, graças à radiação solar absorvida, restitui parte deste calor para a camada atmosférica, que age como uma barreira impedindo que a energia seja tansmitida diretamente do globo para o espaço, gerando duas consequências.

A primeira é o aquecimento da atmosfera; a segunda, é a reemissão da radiação absorvida por ela em todas as direções. Uma parcela importante dessa energia é transferida de volta para a superfície terrestre. Este suplemento de calor que a Terra recebe é exatamente o efeito estufa.

Não fosse este complexo fenômeno, de múltiplas interações entre a radiação solar e os componentes que formam nossa atmosfera, a temperatura na Terra seria de - 18 oC, impedindo e existência de vida tal como conhecemos.

O equilíbrio energético do planeta é garantido quando a quantidade de radiação solar absorvida pelo planeta é a mesma que a radiação refletida mais o calor transferido de volta ao espaço. Acontece, que o sistema climático da Terra está perturbado, em razão do aumento da concentração de gases de efeito estufa gerado por atividades antrópicas. O resultado é o aquecimento global.  

Os gases de efeito estufa (GEE) com maior capacidade de aquecimento são o metano (CH4) e o gás carbônico (CO2), sendo o primeiro 23 vezes mais potente. Sua duração de vida também varia, de 12 anos para o CH4 a 100 anos para o CO2. Além disso, este último é o componente com maior presença na atmosfera, daí ser usado como referência para medir o impacto de um determinado gás sobre o efeito estufa, o que se faz em termos de “CO2 equivalente”.

Entre as atividades antrópicas que tem causado aumento da concentração atmosférica de GEE, continuamente nos últimos 150 anos, está o uso massivo de combustíveis fósseis (carvão, derivados de petróleo e gás natural) e a deflorestação, em benefício de atividades extensivas de agricultura pastagem.

Voltando aos aerossóis, um exemplo de sua influência sobre o clima foi a erupção em 1991 do vulcão Monte Pinatubo, nas Filipinas, que emitiu uma grande quantidade de partículas sulfurosas, chegando até a estratosfera (entre 12 e 50 km de altitude). Cientistas estimaram que este fenômeno tenha provocado uma queda de 0,5 oC na temperatura planetária.

Globalmente, os aerossóis agem como freio do aquecimento climático, já que impedem que uma parte da radiação solar atinja a superfície terrestre. Mas há uma exceção, um tipo de aerossol -o “black carbon”-, cujo efeito contribui para o aumento de temperatura da Terra, devido à sua alta capacidade de absorver a radiação solar incidente.

Seu efeito sobre o clima se mantém quando eles são depositados no solo, já que o escurecimento das superfícies favorece a absorção dos raios solares. Em outras palavras, os black carbon diminuem o albedo terrestre, causando aquecimento.

À exceção de incêndios naturais, as emissões atmosféricas de black carbon são exclusivamente causadas por atividades humanas. São oriundas da combustão incompleta de biomassa e combustíveis fósseis; a “fuligem” que se vê a olho nu.

Um estudo internacional, publicado na Nature Communications em 2019, caracterizou e quantificou carvão e fuligem gerados pela queima incompleta de árvores da Floresta Amazônica, os quais são transportados por via fluvial até o Oceano Atlântico.

Além da vegetação destruída, e com ela sua biodiversidade, os incêndios deixam sua marca no rio Amazonas e seus afluentes na forma de black carbon, que é levado até o mar como carbono orgânico dissolvido, diz o estudo.

O pesquisador Jeffrey Richey, da Universidade de Washington (EUA) e coautor do estudo, explica que “uma parte do carbono gerado nas queimadas da Amazônia vai para a atmosfera na forma de CO2, mas uma alta parcela é depositada no solo e na água na forma de black carbon”.

“Por datação radiométrica [um método que mede a quantidade de isótopos radiativos no material, permitindo determinar sua idade até 60 mil anos atrás] e análise de sua composição molecular, concluímos que a maior parte de black carbon encontrado no rio Amazonas foi produzida nos últimos anos pela queima de árvores”, diz Richey.

Assim, pode-se concluir que os incêndios criminosos amplamente tolerados pelo poder público no período 2019-2022, contribuíram também para o aquecimento global na forma desses aerossóis atípicos, embora a ciência ainda não tenha quantificado este efeito.

Há algumas décadas, os aerossóis mascaravam o aquecimento climático causado pelos gases de efeito estufa. Sua significativa diminuição neste período, especialmente de partículas sulfatadas emitidas por atividades humanas, explica a tendência climática na Europa, onde o aquecimento tem evoluído duas vezes mais rápido que no planeta globalmente.

Mais recentemente, simulações numéricas baseadas em “sistemas de modelização regional” -que reproduzem condições meteorológicas em grande escala, acoplando dados da atmosfera, mares, rios e superfícies continentais- propiciaram avaliar o impacto de aerossóis no aquecimento climático.

Pesquisadores da Universidade de Estocolmo (Suécia) e do Instituto de Ciência Atmosférica e Climática de Zurique (Suíça) avaliaram a influência de aerossóis sobre o aquecimento climático na Europa.

O estudo, Unmasking the Effects of Aerosols on Greenhouse Warming over Europe, foi publicado no final de 2022 na revista JGR Atmospheres. “As partículas de aerossol resfriam o planeta, mas este efeito é de curta duração em comparação com o impacto humano no efeito estufa”, diz o estudo.

Os cientistas descobriram que o aumento da energia solar que chega na superfície terrestre, causado pela redução de aerossóis entre 1979 e 2020, levaram a um aquecimento próximo à superfície de 1 oC, para condições de céu claro e de um pouco mais para todo tipo de céu, na Europa Central e Oriental.

“Isto significa que outras regiões da Terra com altas cargas antropogênicas de aerossóis provavelmente sofrerão aquecimento, se a concentração dessas partículas diminuir”, conclui o estudo.

Fontes: https://www.atmo-bfc.org/qui-sommes-nous/actualites/l-impact-des-aerosols-sur-le-climat

https://www.umr-cnrm.fr/spip.php?article924&lang=fr

https://www.cnrs.fr/cw/dossiers/dosclim1/biblio/pigb14/02_aerosols.htm

https://books.openedition.org/editionscnrs/11354

https://www.cea.fr/multimedia/Documents/publications/clefs-cea/archives/fr/clefs200857memoC.pdf

https://scitechdaily.com/black-carbon-found-in-the-amazon-river-most-from-recent-forest-burnings/

https://agupubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1029/2021JD035889

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