Estrutura
de um pedaço de hidrato de gás. IMAGEM: Wusel007 https://www.offshore-technology.com/features/featuremethane-hydrates-new-gas-boom/
Um
trabalho pioneiro, coordenado pelo geólogo brasileiro Marcelo Ketzer,
correlaciona o vazamento de grandes quantidades de metano -de áreas geladas em
leitos oceânicos austrais- com o aquecimento climático.
Os
resultados do estudo estão no artigo Gas hydrate dissociation linked to
contemporary ocean warming in the southern hemisphere, publicado
recentemente na Nature Communications, em parceria com pesquisadores
brasileiros, franceses e suecos.
O hidrato
de gás é um composto em estado sólido de gases e água, fisicamente semelhante
ao gelo. Entre os gases estão o O2, H2, N2, CO2 e CH4; esses dois últimos,
gases de efeito estufa que contribuem para o aquecimento global. Estima-se que
cerca de 6,4 trilhões de toneladas de metano estão aprisionadas em depósitos de
hidratos de gás nas profundezas dos oceanos.
A formação do hidrato gasoso ocorre sob condições de alta pressão e baixa temperatura, daí estar armazenado
a centenas de metros de profundidade em áreas geladas do planeta. O metano
congelado nesses depósitos constitui a maior reserva de carbono orgânico da
Terra.
Com um
potencial de efeito estufa 25 vezes maior que o do gás carbônico, o metano é um
gás altamente deletério para a atmosfera. Daí a má notícia para o clima: o
aumento de temperatura da atmosfera tem causado vazamentos maciços de metano,
por dissociação do hidrato de gás.
“Estima-se
que há mais carbono na forma de metano nos hidratos do que em todos os
combustíveis fósseis combinados; o vazamento de CH4 pode levar a um ciclo de
retroalimentação, no qual o aquecimento do oceano impulsiona o derretimento dos
hidratos, liberando metano do solo oceânico para a superfície [e daí para a
atmosfera]. Quanto mais quente, mais metano vaza”, explica Marcelo Ketzer, professor
de Ciências Ambientais e Sustentabilidade da Linnaeus University, em
Kalmar (Suécia).
Analisando
amostras de sedimento obtidas com auxílio de submarinos operados remotamente, os
pesquisadores da universidade sueca e seus colegas franceses e brasileiros (da UFRGS,
PUC-RS, PUC-RJ e Petrobras), constataram o fenômeno -do descongelamento de
hidratos e vazamento de metano- em áreas do Atlântico Sul próximas da costa do
Brasil.
“Essas
descobertas contribuem com novas evidências que reforçam a ideia de um fenômeno
global”, afirma Ketzer. Outra constatação da pesquisa é que o metano, enquanto vai
se dissolvendo na água do mar, é consumido parcialmente por micro-organismos, o
que resulta na formação de dióxido de carbono. Em grandes quantidades, este
processo pode alterar a química dos oceanos.
“A
dissociação do hidrato e o vazamento de metano é um processo de longo prazo que
pode durar séculos e amplificar significativamente os efeitos da mudança climática
e produzir acidificação das águas”, diz Ketzer. Os dados da pesquisa foram
coletados em três expedições offshore no Atlântico Sul, em 2011, 2013 e
2014, e posteriormente processados na Linnaeus University.
Os dados
continuam sendo trabalhados, com o objetivo de quantificar o metano existente
na região estudada e estimar quanto pode ser liberado nas águas pela dissociação
do hidrato de gás futuramente. O mesmo grupo de pesquisa participou de uma expedição
recente para avaliar o metano no Mar Báltico, onde “não há hidrato de gás
porque sua profundidade é pequena, mas acúmulo significativo de
metano nos sedimentos”, conclui Marcelo Ketzer.
A
pesquisa coordenada pelo pesquisador brasileiro nos faz pensar em outro bioma
nacional do qual muito tem se falado -pelo completo descaso do atual governo em
relação à sua preservação- e que pode ser uma fonte de metano importante: a
floresta Amazônica.
Não há
dados que permitam avaliar em escala global o impacto de emissões de metano por
decomposição microbiana de matéria orgânica oriunda de extensas superfícies de
mata destruída.
Por um
lado, áreas devastadas da maior floresta tropical do mundo dando lugar à
expansão de fronteiras agrícolas, reduzindo o estoque de carbono no solo. Por
outro lado, a troca de floresta primária por área de pastagem, introduzindo
novas emissões de metano decorrentes de atividade metabólica do gado. Qual o
impacto dessas emissões sobre o clima global? Com a palavra a ciência.
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