segunda-feira, 14 de novembro de 2022

COP27: Desmatamento e mudança climática reduzem vazão de rios do Cerrado brasileiro e podem afetar geração de energia

Mantido atual ritmo de devastação do bioma, volume de águas pode diminuir 34% até 2050, diz estudo divulgado na presente Cúpula Mundial do Clima

https://www.sindaen.org.br/2018/04/04/o-berco-das-aguas-esta-em-perigo/

O geógrafo Yuri Salmona, da Universidade de Brasília, apresentou no último dia 10, na Conferência das Partes (COP27) de Sharm El-Sheikh (Egito), os resultados de sua pesquisa sobre o impacto do desmatamento e do aquecimento global nos rios do Cerrado.

Ele avaliou as nascentes de 81 bacias hidrográficas do bioma, entre elas 8 das 12 principais, como as dos rios São Francisco e Paraná. 88% delas apresentaram queda de vazão causada por mudanças do uso do solo, principalmente para expansão do agronegócio, e por mudanças climáticas planetárias, diz o estudo.

O impacto da intervenção humana direta em áreas próximas aos rios sobre a redução do fluxo de águas foi estimado em cerca de 57%; o aquecimento climático global, que em grande medida se deve também a ações antrópicas, seria responsável por 43%. “De 1985 para cá, perdemos 19,7 mil m3 de água por segundo nas bacias analisadas, o equivalente à vazão do rio Paraná. É como se tivéssemos jogado fora o rio Paraná inteiro”, diz Salmona.

Usando modelos matemáticos e compilando dados históricos de vazão dos rios, mudança do uso do solo, chuvas e taxas de desmatamento e de evapotranspiração da vegetação, o geógrafo simulou a tendência da redução dos fluxos de água ao horizonte de 2050: mais de 1/3 (34%) do volume de águas pode ser perdido, caso o atual ritmo de destruição do bioma seja mantido. Entre 1985 e 2018, os rios perderam 15,4% de sua vazão.

Nos próximos 28 anos, 93% das bacias do Cerrado devem sofrer redução da disponibilidade de água, como consta no artigo de Salmona, sob o título The heavy impact of deforestation and climate change on the streamflows of the Brazilian Cerrado biome and a worrying future, em fase de revisão para ser publicado no journal Sustainability. O estudo recebeu apoio do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN).

Os rios que nascem no Cerrado abastecem milhões de pessoas e alimentam barragens hidrelétricas que, globalmente, produzem cerca de 80% de toda a eletricidade consumida no Brasil. “Menos água significa que vamos gerar menos energia elétrica nas usinas. Conservar o Cerrado é uma questão estratégica e de soberania nacional”, explica Salmona, cujo estudo é parte do seu doutorado em Ciências Florestais, obtido recentemente na UnB.

O Cerrado, maior bioma nacional depois da Amazônia, é uma região de floresta de savana que dispõe da maior biodiversidade do mundo, com cerca de 14 mil espécies de planta e uma fauna diversificada. Estima-se que 47% de sua área original já foi desmatada. O bioma perdeu 4,1 mil km2 entre janeiro e julho deste ano, um avanço de 28,2% em relação ao mesmo período de 2021. Os dados são do sistema Deter do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

A maior parte da vegetação primária do Cerrado vem sendo destruída para dar lugar a áreas de pasto e de cultivo de commodities. De acordo com a plataforma de monitoramento do uso do solo no país (MapBiomas), a expansão da fronteira agropecuária foi responsável pelo desmatamento de 45,4% do Cerrado.

Um grande volume de águas do cerrado é utilizado para irrigação, principalmente de culturas de soja, por meio de outorgas concedidas pelos governos estaduais. “O agronegócio está inviabilizando seu próprio modelo ao desmatar e utilizar a água dessa maneira, sem controle externo, porque ele depende da água para funcionar. Não estamos exportando apenas soja, mas também água”, diz o pesquisador.

O biólogo e pesquisador Reuber Brandão explica que o desmatamento e o avanço descontrolado do agronegócio no Cerrado estão matando nascentes de água e pequenas lagoas, que são extremamente importantes para abastecer a população e para a geração de energia. Para Brandão, commodities agrícolas brasileiras são competitivas porque externalidades, como água e biodiversidade, ficam fora do custo de produção.

“Quando você exporta uma commodity como a soja, o valor da água e da biodiversidade perdidas não está embutido no preço da semente. Por isso o Brasil é competitivo”, disse o pesquisador em entrevista à BBC News Brasil, em setembro de 2022.

Fontes: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63562381?fbclid=IwAR1B3imfyNjhgOWcZAQPnwEVFkL-Nk7lqOoZGJBsstA7h9lrgnmzNwfV6pk

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62718299

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