A
perda total de florestas tropicais mundo afora em 2019 foi de quase 38 mil km2
(194 x 194 km). Foi a terceira maior área de mata destruída desde 2002,
superada apenas pela devastação por incêndios em 2016 e 2017, especialmente
no Brasil.
Os
dados foram publicados pelo Instituto de Recursos Mundiais (World Resources
Institute - WRI), através do programa Vigilância Global de Florestas (Global
Forest Watch - GFW).
“O nível de perda de floresta que constatamos em 2019 é inaceitável. Estamos no caminho errado”, declarou Frances Seymour, pesquisadora do WRI e participante do programa GFW.
A
gestora do programa, Mikaela Weisse, já deplorava em 2019, quando da divulgação
do desmatamento de 2018, que os compromissos de governos e empresas para reduzir
à metade a perda de florestas tropicais até o final de 2020 dificilmente se
concretizaria.
“A
taxa de devastação de florestas úmidas primárias no ano passado equivale à um campo
de futebol a cada 6 segundos”, escreve Weisse em artigo publicado ontem, destacando a importância de tais biomas
para a biodiversidade e a estocagem de carbono.
Os
pesquisadores do GFW estimam que a perda de floresta tropical primária em 2019
significa a liberação na atmosfera de 2 bilhões de toneladas de CO2, o equivalente
às emissões totais de todos os veículos de rodagem em um ano típico nos Estados
Unidos.
Para
Seymour, as perspectivas de um refluxo do desmatamento em 2020 não são nada otimistas, à medida em que perdure a pandemia de Covid-19. As restrições de
mobilidade e os limites orçamentários dos países para enfrentar a crise
econômica pós-pandemia devem dificultar as políticas para frear a devastação,
declara a pesquisadora.
Globalmente,
nas zonas intertropicais (incluindo as florestas não primárias), a perda de
cobertura das árvores foi de 120 mil km2 no ano passado. Desde 2000,
o planeta já perdeu cerca de 10% de sua cobertura de árvores tropicais.
Perdas
de floresta primária: total no mundo e no Brasil (em km2). Adaptado
de
Em
2002, apenas dois países -Brasil e Indonésia- respondiam por 71% da perda
total de florestas tropicais primárias. Já em 2018, nota-se uma mudança clara
na distribuição do desmatamento global: Brasil e Indonésia representam juntos
46% do total, enquanto países como Colômbia, Costa do Marfim, Gana e Congo
tiveram suas taxas de perda fortemente aumentadas.
O
mundo perdeu no ano passado 37.636 km2 de florestas tropicais primárias, dos
quais 13.610 km2 no Brasil, ou 36% do total. O top ten dos países que
mais perderam florestas tropicais primárias é o seguinte: Brasil, Congo,
Indonésia, Colômbia, Bolívia, Malásia, Peru, Madagascar, Papua Nova Guiné e
Camarões.
O
programa Global Forest Watch utiliza dados de pesquisadores da
Universidade de Maryland (EUA), que processam imagens de satélite sobre a perda
de cobertura vegetal das florestas tropicais no mundo todo. Esses dados mostram
que grande parte da perda de cobertura de árvores é de áreas reflorestadas ou
de florestas não primárias.
Outras
análises apresentam números diferentes. Duas agências da ONU divulgaram no mês
passado um relatório no qual afirmam que o desmatamento global foi em média de
cerca de 100 mil km2 por ano, desde 2015. Elas trabalharam com dados
oficiais, enviados por cada país.
As
florestas antigas, ditas primárias, além de serem de suma importância para capturar
o dióxido de carbono atmosférico e manter a biodiversidade, uma vez destruídas,
podem levar décadas para se regenerar, dizem os cientistas.
Essa
destruição é feita com diversas finalidades: retirada de mata para dar lugar a
atividades agropecuárias, mineração, abertura de estradas e outras
infraestruturas. Boa parte da limpeza é feita mediante queimadas, que invariavelmente
se espalham fora de controle, principalmente em florestas brasileiras.
Em
2019, o Brasil registrou um alto número de queimadas, particularmente no mês de
agosto. Embora fosse um período de seca, incêndios espontâneos são raros;
portanto, são ações criminosas de grileiros, executadas sob a complacência de
autoridades federais.
De
fato, desde que o atual presidente assumiu suas funções no início de 2019, uma
política de estado vem sendo implantada para fomentar atividades de mineração e
agronegócio, em detrimento da preservação ambiental e da proteção de terras
indígenas, especialmente na Amazônia. O desrespeito às leis ambientais vigentes é, na prática, garantido
pelo Ministério do Meio Ambiente.
Em
relação a 2018, a perda total de florestas primárias no Brasil em 2019 foi
ligeiramente superior, de quase 14 mil km2. Muitas das queimadas ocorreram
em terras que já haviam sido desmatadas em anos anteriores e visaram o preparo
do terreno para agricultura e pecuária. Somente 20% dos fogos destruíram matas
antigas, informa Mikaela Weisse.
Em
contrapartida, como mostram dados de programas de monitoramento, houve um
aumento da derrubada de mata para preparo de áreas destinadas à agricultura. “Embora
a tendência geral da perda de florestas primárias tenha sido apenas de um
pequeno aumento [anual], acreditamos que o desmatamento esteja piorando”, diz Weisse.
Na
vizinha Bolívia, as queimadas foram a principal causa do aumento significativo
do desmatamento em 2019, que somou 3 mil km2, quase o dobro do registrado em
2018.
O
país andino ocupa atualmente o quarto lugar no ranking global do desmatamento,
atrás do Brasil, Congo e Indonésia; este último apresentando uma queda pelo
terceiro ano consecutivo: 5% a menos de áreas de florestas primárias,
em relação a 2018. O país do sudeste asiático registrou em 2019 uma alta quantidade
de queimadas, mas tal como o Brasil, a maior parte delas ocorreu em terras anteriormente degradas.
Na
Colômbia também houve um declínio do desmatamento; a área de cobertura
destruída foi a mesma que a verificada em 2016. Um acordo de paz entre o governo
e o grupo guerrilheiro FARC gerou a desocupação de zonas, o que possibilitou a proliferação da exploração ilegal de madeira, causando elevadas perdas de
floresta primária em 2017 e 2018.
Na
África Central, a República Democrática do Congo registrou “perdas sustentáveis”,
segundo Elizabeth Goldman, diretora de pesquisa do programa GFW. Embora o
desmatamento esteja ligado à agricultura de subsistência, há sinais de que o
agronegócio e a mineração em grande escala avançam sobre áreas de floresta. Mesmo
que a área de cobertura perdida em 2019 tenha aumentado pouco em relação a
2018, ela dobrou em relação a 2012.
Já
na África Ocidental, Gana e Costa do Marfim apresentaram uma queda considerável
do desmatamento; o primeiro registrou o nível mais baixo desde 2014, e o
segundo regrediu para uma taxa anual comparável à de 2005. A devastação nesses dois
países foi amplamente motivada pelo aumento da produção de cacau, fomentada
pela demanda no mercado mundial.
Um
acordo firmado entre os governos e produtores do setor é animador para frear o
desmatamento, “embora seja um pouco cedo para afirmar porque [a leve redução
obtida] foi verificada apenas em um ano”, avalia Weisse.
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