Limite para elevação da temperatura planetária fixado pelo Acordo de Paris está cada vez mais longe de ser alcançado
A 30a Conferência Partes (COP30, Conferência das
Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas), que começa amanhã em Belém, tem como
principal desafio retomar o engajamento dos países para conter o aquecimento
global. Um compromisso assumido na COP21, realizada na capital francesa em
2015.
O desafio foi lançado pelo presidente Lula na última sexta-feira: "O mundo
ainda está distante de atingir o objetivo do Acordo de Paris".
O Acordo de Paris (2015), que substituiu o Protocolo de
Kyoto (1997), foi à época efusivamente celebrado, dado o seu caráter de
ineditismo: pela primeira vez envolveu as 195 nações da ONU nos esforços para
reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Tinha como meta limitar o aquecimento global em 2 oC até o final do
século, em relação ao nível pré-industrial, visando idealmente um aumento
máximo de 1,5 oC. Entrou em vigor em janeiro de 2016 e foi
ratificado pelos 195 países signatários.
Pelo tratado, os países deveriam apresentar -a cada cinco anos e de modo
voluntário- planos nacionais de combate às mudanças climáticas (NDCs) e
renová-los sempre com metas mais ambiciosas que as precedentes.
Outra inovação do acordo foi a criação de um fundo de combate à mudança
climática, com recursos dos países mais industrializados e emissores de gases
deletérios, que seriam destinados a ajudar países pobres a reduzir suas
emissões e adaptar-se aos efeitos mais nocivos do aquecimento global.
Como era de se esperar, os recursos financeiros advindos do celebrado acordo
foram insuficientes, gerando impacto negativo na transição energética. As
emissões poluentes e a temperatura planetária continuaram aumentando, como
também a ocorrência de eventos climáticos extremos.
De 2023 a 2024, a quantidade de gases de efeito estufa liberada na atmosfera
cresceu 2,3%, em toneladas de CO2. Resultado: no ano passado foi registrada uma
elevação da temperatura média global recorde, de 1,6 oC!
De acordo com um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente,
se cumpridos os planos nacionais de combate à mudança climática, o melhor
cenário para 2100 seria um aumento da temperatura planetária de 2,3 oC.
Um outro relatório, publicado recentemente pelo Instituto de Meio Ambiente de
Estocolmo, indica que a produção de combustível fóssil até 2030 deve superar em
60% o limite fixado pelo Acordo de Paris para limitar o aquecimento global em 2
oC.
Ainda assim, o secretário-geral da ONU, António Guterres comemora: "Sem
este ato de coragem coletiva [o Acordo de Paris], ainda estaríamos caminhando
para um futuro impossível de aquecimento descontrolado, de 5 oC".
O maior obstáculo para a execução plena do Acordo de Paris é sem dúvida a
insuficiência de recursos alocados pelos países ricos ao fundo climático,
destinado a financiar ações contra a crise climática dos países em
desenvolvimento. Na COP29 do ano passado em Baku, esses países postularam uma
soma anual de US$ 1,3 trilhão, mas obtiveram menos de 25%: US$ 300 bilhões.
Não bastassem os fracassos acumulados desde a sua entrada em vigor em 2016, o
segundo maior poluidor do planeta, os Estados Unidos, agora sob a presidência
de um negacionista climático, abandonaram o Acordo de Paris.
Há pouco mais de um mês do final do ano, apenas 79 dos 195 países apresentaram
seus planos nacionais para o clima (NDCs) em 2025.
As lacunas do Acordo de Paris, desde o início da sua vigência há quase 10 anos,
tem sido objeto de discussão nas últimas conferências climáticas e estarão na
agenda da COP30, que começa nesta segunda-feira (10).
Para José Marengo, pesquisador do Cemaden, cuja carreira científica é marcada
por sua participação em quase todos os relatórios do Painel Intergovernamental
sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês), ainda vale a pena manter a meta
ideal do Acordo de Paris, de limitar o aquecimento global em 1,5 oC.
"Se emitirmos menos gases de efeito estufa, talvez possamos reduzir um
pouco a tendência; continuaríamos tendo aquecimento, mas em menor intensidade,
com menos desastres associados aos extremos", diz Marengo em entrevista ao
Jornal da Unesp.
"Vejo a meta de 1,5 oC como a luz amarela de um semáforo,
mostrando que estamos perto demais do limite", acrescenta o especialista
em desastres naturais.
Radicado no Brasil há 3 décadas, o peruano José Marengo afirma que, embora a
ciência climática tenha evoluído nos últimos 30 anos, as análises tem repetido
os mesmos resultados, "com novas fontes de dados, novos satélites e novos
modelos matemáticos".
Marengo fala sobre a evolução do conceito de "ponto de não retorno":
grau de degradação máxima que ecossistemas, como a Floresta Amazônica e o
Permafrost Siberiano, suportam antes de decaírem em uma espiral irreversível e
se estabilizarem em uma forma diferente.
Ele alerta sobre o risco de longos períodos de seca transformarem a maior
floresta tropical do planeta em fonte de CO2, algo que já ocorre em algumas
áreas da Amazônia, porém ainda de modo reversível. A dúvida no meio científico
é sobre "quando" a floresta poderia deixar de ser permanentemente um
sumidouro de CO2.
Sobre o processo multilateral de gestão climática global, que estará no centro
das discussões da COP30, Marengo lembra que esta "não é uma conferência
científica, é uma conferência das partes das Nações Unidas sobre mudanças
climáticas". Ou seja, se trata de negociações, que são mais importantes do
que os eventos científicos, diz o pesquisador.
Sob a presidência do Brasil, o evento de Belém deve centrar esforços na
cooperação internacional (multilateralismo), com foco na valorização da
Amazônia como solução climática, na exploração de sua biodiversidade com
desenvolvimento regional sustentável, na inclusão social de sua população e no
financiamento da transição energética em países em desenvolvimento.
A Cúpula de Líderes, ocorrida nos últimos dias 6 e 7 abordou temas como a
proteção a florestas e o investimento em fontes de energia limpa.
53 países apoiaram a proposta do governo brasileiro de criação do Fundo
Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), com aporte inicial
de US$ 10 bilhões.
Trata-se de um mecanismo inovador, visando garantir de modo permanente a
conservação de biomas com função primordial na regulação do clima. Entre outras
iniciativas adotadas pela cúpula, destaca-se a proposta de quadruplicar a
produção de biocombustíveis até 2035.
A realização da COP30 no Brasil, é uma grande
oportunidade para o país reafirmar seu protagonismo no multilateralismo para
conter a crise climática. Além de dispor do maior bioma tropical do planeta, possui
uma das matrizes energéticas mais limpas entre as maiores economias do mundo.
Sua liderança à frente da atual conferência sobre
o clima, com propostas claras de conciliação da preservação ambiental com
desenvolvimento sustentável e justiça social, pode frear a crescente onda de
negacionismo climático e contribuir para que o Acordo de Paris seja plenamente
cumprido.
Fontes:
https://www.nexojornal.com.br/expresso/2025/11/07/acordo-de-paris-10-anos-mudancas-climaticas

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