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terça-feira, 6 de abril de 2010

'Ar condicionado para todos' causaria mais emissão de CO2 e mais calor nas cidades

Idéia defendida por Bjorn Lomborg para enfrentar aquecimento global contraria ciência

FOTO: http://www.daylife.com/topic/Bjorn_Lomborg
O professor dinamarquês Bjorn Lomborg (foto), ambienalista cético e autor de livro homônimo, em sua passagem recente pelo Brasil defendeu que uma das soluções "inteligentes" para combater o aquecimento global seria tornar os aparelhos de ar condicionado disponíveis para toda a população (ver matéria publicada em http://www.amazonia.org.br/).

Não bastasse o disparate do ponto de vista econômico - não só para a nossa população, como para a do planeta em geral - a solução proposta pelo pesquisador escandinavo carece de sustentação científica. Isto porque, em termos globais, para cada "unidade de frio" produzida por equipamentos convencionais de ar condicionado, uma quantidade equivalente de energia é consumida em usinas termoelétricas, o que significa despejar na atmosfera uma quantidade de CO2 importante. Portanto, em escala planetária, mais ar condicionado, mais CO2 na atmosfera.

A explicação termodinâmica que leva a essa conclusão também não é difícil de se entender. Termodinâmica é um ramo da física que trata das transformações de energia em sistemas físicos macroscópicos; é definida comumente como "ciência".

Com base nas leis da termodinâmica, produzir frio requer a entrada de energia no sistema (equipamento de ar condicionado), com a liberação concomitante de calor para fora dele. O índice que mede a eficácia do processo (COP) é uma razão entre o frio produzido e a energia consumida pelo equipamento. Pode-se estimar um valor global médio desse índice igual a 3, o que significa gerar 3 unidades de frio no espaço a climatizar, a custa de 1 unidade de energia consumida pelo ar condicionado, liberando na atmosfera 4 unidades de calor.

Mesmo que a energia consumida pelo ar condicionado seja oriunda de uma fonte renovável, o balanço para o meio ambiente é negativo, já que o calor transferido à atmosfera é cerca de 30% maior do que o retirado do espaço climatizado. No caso do Brasil, nossa eletricidade é majoritariamente de origem hidráulica (i.é., a maior parte é proveniente de uma fonte renovável). Mas nossa capacidade hidrelétrica instalada é limitada e a eletricidade de origem térmica (com uso de combustíveis fósseis) tende a crescer. Ou seja, mesmo em nosso país, é possível que mais aparelhos de ar condicionado impliquem em mais CO2 na atmosfera.

Uma outra conta bem simples - para melhor entender a relação entre ar condicionado e emissão de CO2 - é multiplicar o índice que mede a eficiência de conversão termoelétrica pelo COP. Um valor global razoável para o primeiro índice é de 1/3. Multiplicando um pelo outro dá 1, o que explica a afirmação inicial de que cada unidade de frio produzida por um ar condicionado implica em igual consumo de energia em uma usina termoelétrica.

Além de um aumento global das emissões de CO2, há o problema das ondas de calor nos centros urbanos, causadas em boa medida pelos aparelhos de ar condicionado (o tal calor liberado no processo para a atmosfera). Nesse aspecto, uma das soluções apontadas pelo professor Lomborg - pintar as paredes externas das edificações de branco - parece correta, pois aumentaria o "albedo" (parcela da luz solar emitida de volta ao espaço) e, portanto, contribuiria para amenizar o calor nas grandes cidades.

Outra solução, de base mais tecnológica, para mitigar "ilhas calor" via aumento do albedo, seria o o uso de ar condicionado movido a energia solar. Mas infelizmente essa alternativa ainda é objeto de pesquisa mundo afora, e deve demorar um pouco para se tornar uma solução técnica e economicamente viável.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Efeito Oásis

Jornal da Ciência, 5 de novembro de 2008.

Efeito oásis para mitigar ilhas de calor, artigo de Antonio Pralon













 “Em termos de legislação, ainda temos muito chão pela frente, até que a energia solar receba os devidos incentivos para uso em larga escala”

Antonio Pralon é professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e bolsista Capes em estágio pós-doutoral no Instituto Francês do Frio Industrial. Artigo enviado pelo autor ao “JC e-mail”:

“Efeito oásis” é um conceito defendido pelo cientista francês Francis Meunier – membro do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) e Diretor do Instituto Francês do Frio Industrial, sediado em Paris – para amenizar “ondas térmicas” em áreas urbanas, geradas por “ilhas de calor”.

Para se obter o efeito oásis, o pesquisador francês propõe duas alternativas tecnológicas aos equipamentos convencionais de ar condicionado (A/C), que são responsáveis, em boa medida, pela intensificação das ilhas de calor.

A primeira, é transferir para o subsolo ou para cursos naturais de água (rios, lençóis freáticos, etc) o calor rejeitado dos aparelhos de A/C, principalmente das grandes instalações. A segunda, é usar sistemas de A/C movidos a energia solar (térmica ou fotovoltaica); os raios solares captados nesses equipamentos não estariam mais aquecendo o ar ambiente, mas sim contribuindo para refrigerar espaços fechados.

Para o cientista, se as alternativas acima fossem implementadas em larga escala simultaneamente ao uso de materiais de construção termicamente apropriados, a edificações de baixo consumo energético e ao uso de veículos elétricos, seria possível criar um efeito oásis: áreas urbanas mais frias do que áreas periféricas rurais.











 

Efeito ilha de calor

Parece não haver dúvida nos meios científicos que a atividade humana tem alterado o clima de áreas urbanas, produzindo o chamado “efeito ilha de calor”, cuja conseqüência é o aumento da temperatura do ar ambiente.

Entre os diversos fatores relacionados à atividade humana responsáveis pelo fenômeno ilha de calor, destacam-se:

a) rejeitos térmicos, decorrentes do consumo antropogênico de energia, incluindo transportes;

b) redução do “albedo” – parcela da radiação solar transmitida de volta ao espaço – pelo uso de materiais de construção (concreto, pavimento de ruas, telhados) que absorvem os raios solares;

c) o chamado “efeito canyon radiativo”, provocado pelas trocas de energia entre os telhados das edificações e o céu, que resulta em aumento da energia solar absorvida;

d) redução das superfícies naturais de evaporação e vegetação, causada pelo processo de urbanização;

e) aumento do efeito estufa, devido à emissão de gases resultantes da atividade industrial e dos meios de transporte.

Em decorrência do aumento de temperatura provocado por uma ilha de calor, um aumento na energia consumida pelas edificações torna-se inevitável. Quanto maior a temperatura do ar ambiente, maior a energia consumida nos equipamentos de A/C, uma vez que estes sofrem uma queda de eficiência proporcional à diferença de temperatura entre o ar externo e o espaço a climatizar.

Energia solar térmica ou fotovoltaica?

A análise comparativa do professor Meunier, entre essas duas possibilidades de uso da energia solar para acionar sistemas de A/C, considera tecnologias de refrigeração distintas: um ciclo baseado em sorção, acionado por um coletor solar (CS); e um ciclo a compressão, acionado por um painel fotovoltaico (PV). Nos dois casos, considera-se que o calor retirado do recinto é dissipado no subsolo.

As eficiências de conversão energética adotadas são de 40% para o CS, e de 15% para o PV, valores compatíveis com os equipamentos comerciais disponíveis atualmente. As parcelas da energia solar perdidas por reflexão e radiação do CS e do PV são de 30% e 25%, respectivamente. Tais valores, segundo o autor, são da mesma ordem de grandeza que o albedo médio estimado para áreas não urbanizadas. Porém, como se explica mais adiante, em ambos os casos, a energia solar liberada no ambiente, na forma de calor, é menor do que aquela oriunda da incidência da radiação solar no meio rural.

A análise do balanço de energia nos respectivos ciclos de refrigeração (sorção e compressão) revela que a quantidade de calor liberado no subsolo é praticamente a mesma nos dois casos. Para o sistema PV/compressão, a carga de resfriamento (energia retirada do recinto) é quase duas vezes maior do que no sistema CS/sorção, o que significa um desempenho global melhor da primeira opção tecnológica.

Entretanto, para o sistema CS/sorção, a razão entre o calor liberado para o subsolo e o calor retirado do recinto é duas vezes maior, o que torna este sistema uma opção mais eficiente para mitigar o efeito ilha de calor. Essa vantagem do sistema CS/sorção, em relação ao sistema PV/compressão, resulta dos respectivos valores de “albedo aparente”: 0,7 no primeiro caso, contra 0,4 no segundo.

Isto equivale dizer que o sistema termossolar transfere para o ar ambiente 30% da radiação incidente, enquanto que o fotovoltaico, 60%. O albedo aparente é a soma da fração da radiação solar incidente que é perdida – por reflexão e trocas radiativas – com a eficiência de conversão energética.

Ambas as tecnologias consideradas na análise – CS/sorção e PV/compressão – contribuem para o “efeito oásis” preconizado pelo autor, uma vez que atenuam o efeito da radiação solar sobre a temperatura do ar ambiente, isto é, propiciam albedos maiores que o albedo global médio, e muito superiores ao albedo local (de aglomerações urbanas).

Nova legislação facilita

As proposições do professor Meunier estão em absoluta consonância com as medidas aprovadas pelo parlamento francês no último dia 21, baseadas nos estudos do grupo de trabalho Grenelle Ambiental. O projeto de lei aprovado reafirma o chamado “Fator 4” (redução em 75% das emissões de gases de efeito estufa da França até 2050), e contempla, entre outros, os seguintes pontos:

i) reforço às energias renováveis (geração eólica, principalmente), passando de 20 a 23% a proporção dessas fontes em relação ao consumo de energia primária, até 2020;

ii) generalização de edificações de baixo consumo em 2012, com a renovação (implementação de novos materiais isolantes) de 400 mil unidades por ano, a partir de 2013;

iii) proibição da venda de lâmpadas incandescentes, a partir de 2010;

iv) prioridade ao uso de transporte alternativo (em relação às estradas de rodagem) e ao transporte coletivo (modernização da infra-estrutura ferroviária e criação de 2.000 km de novas linhas até 2020; veículos adquiridos pelo Estado, com emissões de CO2 inferiores a 130 g/km).

Realidade brasileira

Evidentemente, as propostas do professor Meunier não podem ser aplicadas irrestritamente ao Brasil, por diversas razões, embora as alternativas tecnológicas para A/C descritas acima sejam pertinentes a nossa realidade.

A energia consumida por equipamentos de ar condicionado é relevante na matriz energética nacional, conforme indicam alguns dados: na indústria têxtil e em prédios comerciais os sistemas de A/C respondem por 40% do total de energia elétrica consumida; nos aeroportos esse número chega a 50%; em supermercados, centros comerciais (shoppings) e bancos o consumo de energia na climatização supera os 70% do total. O faturamento do setor de A/C em 2007 foi de quase R$ 4 bilhões.

Assim, o uso de sumidouros naturais (subsolo, ou água), além de contribuir para mitigar ilhas de calor nos grandes centros urbanos de nosso país, propicia melhores desempenhos dos sistemas de A/C e, portanto, menores consumos de eletricidade.

Por outro lado, o uso de energia solar para acionar A/C pode ser uma alternativa interessante, especialmente em regiões ensolaradas (Norte e Nordeste), onde a demanda de climatização é alta. A escolha da tecnologia solar, no entanto, deve levar em conta outros fatores, além da eficiência de conversão energética; por exemplo, os custos por metro quadrado, bem como sua disponibilidade no mercado brasileiro.

Obviamente, em termos de legislação, ainda temos muito chão pela frente, até que a energia solar receba os devidos incentivos para uso em larga escala. Enquanto isso, que prossigam as pesquisas aplicadas em ar condicionado solar!