quarta-feira, 28 de julho de 2021

Mudança Climática: por que o próximo relatório de especialistas da ONU é tão aguardado?

Informe científico previsto para 9 de agosto deve reforçar alertas anteriores sobre consequências nefastas do aquecimento global, à luz de novos conhecimentos

Pesquisadores da Universidade de Northumbria (Reino Unido) investigam degelo de permafrost na Sibéria https://phys.org/news/2021-03-impact-climate-siberia-permafrost.html Impacto do aquecimento global sobre áreas geladas, como glaciais e permafrost, que representam 10% da superfície terrestre, é objeto de “relatório de avaliação” do IPCC/ONU  

Daqui há 12 dias, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC), coordenado pela ONU, deve emitir um novo alerta sobre a situação climática planetária. E não será apenas “mais um”.

Desta vez o que será publicado resulta de uma compilação de 14 mil artigos científicos. Trata-se da primeira parte da 6ª edição de um “relatório de avaliação” que o IPCC divulga a cada sete anos.

Até sua publicação, representantes dos 195 países do mundo devem aprovar o documento “sumário para tomadores de decisão”, uma nova carta de intenções para que o conjunto das nações cumpram suas metas assumidas no Acordo de Paris, em 2015.

O IPCC iniciou seus trabalhos no último dia 6, via plenária virtual, com a participação de experts climáticos e representantes das 195 nações sob égide da ONU.

Criado em 1988, o painel de especialistas climáticos da ONU tem por missão avaliar de forma clara e objetiva as informações científicas que permitam entender melhor o aquecimento global de origem antrópica e seu impacto sobre toda forma de vida e suas consequências e riscos para a humanidade.

O IPCC prepara dois tipos de relatório a serem divulgados no próximo dia 9: informes especiais sobre temas específicos, como os três publicados desde 2018 (sobre desafios de um aquecimento climático estabilizado a + 1,5 oC, sobre os oceanos e a criosfera, e sobre o solo), e os chamados “relatórios de avaliação”, publicados a cada sete anos. Foram cinco publicações desde a criação do IPCC, a última em 2014.

Em 9 de agosto será divulgada a primeira parte do relatório de 2021. “Esses relatórios de avaliação são elaborados em três partes, cada uma sob responsabilidade de um grupo de trabalho específico: a 1ª parte consiste de uma atualização dos conhecimentos científicos sobre a evolução do clima; a 2ª parte aborda os impactos e as adaptações à mudança climática; e a 3ª parte aponta as soluções possíveis e necessárias [de mitigação]”, explica Sandrine Marthy, pesquisadora francesa do Laboratório de Economia Aplicada de Grenoble.

Apenas a 1ª parte do relatório de avaliação será divulgada em 9 de agosto; as outras duas estão previstas para serem publicadas em fevereiro e em março de 2022 e o relatório final em outubro do mesmo ano, esclarece o porta-voz para o clima do Greenpeace France, Clément Sénéchal.

O principal objetivo do IPCC não é produzir novos conhecimentos científicos, mas realizar uma síntese atualizada dos trabalhos existentes, com foco nos artigos publicados em revistas especializadas com comitê editorial, acrescenta Marthy. Um colossal trabalho realizado nos últimos sete anos, envolvendo 234 autores de 14.000 artigos científicos.

Esta primeira parte do relatório deve revelar diferenças marcantes em relação ao que foi divulgado em 2014. “Com a proliferação dos estudos, a ciência climática aprofundou-se”, observa Sénéchal. Ele exemplifica, citando trabalhos em um ramo específico da climatologia (a “atribuição”), que permitiram uma melhor compreensão dos mecanismos pelos quais as atividades humanas causam mudança climática.

O quinto Relatório de Avaliação já falava de uma “clara influência” de atividades antrópicas sobre o clima. Uma atualização das pesquisas deve deixar ainda menos dúvidas sobre esta relação. Em janeiro deste ano, um estudo publicado na revista Nature Climate Change por uma equipe internacional de cientistas concluiu que “quase a totalidade do aquecimento global registrado desde o início da era industrial foi provocado por atividades humanas”.

Pesquisas recentes evidenciaram que a intensificação da ocorrência de fenômenos extremos, como as ondas de calor que ocorreram na Sibéria em 2020 e na Ásia em 2016, seria impossível sem o aquecimento climático. “O IPCC deve também dedicar uma especial atenção à compreensão mais refinada que a ciência alcançou sobre os impactos regionais do aquecimento global”, destaca Sénéchal.

A grande questão que se coloca é como esta primeira parte do informe de avaliação do IPCC será absorvida pelos 195 países membros da ONU? São milhares de páginas e, mesmo sua versão resumida -dirigida aos formuladores de políticas- com algumas dezenas de páginas, já está provocando um vai-e-vem entre alguns desses atores. Isto tem ocorrido “tanto entre revisores (outros especialistas científicos) como entre alguns representantes de países”, diz Sandrine Marthy.

A diretora do programa climático do Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais (Iddri), Lola Vallejo, adverte que, na busca de um amplo acordo para a redação final do resumo para os tomadores de decisão, alguns Estados podem tentar limitar o seu alcance.

Os diálogos entre os especialistas climáticos responsáveis pelo relatório e as delegações dos países estão sendo bem monitorados, para que a versão final do resumo seja robusta em seus aspectos científicos, explica Vallejo.

O principal desafio do IPCC nesta sessão plenária é garantir uma compreensão adequada do relatório e, consequentemente, de sua apropriação por parte dos governos. “Não deve ser apenas um relatório a mais, mas sim um inventário da ciência climática para ser assimilado pelos Estados”, acrescenta Vallejos.

Clément Sénéchal acredita que esta primeira parte do informe não suscitará maiores polêmicas, nem intervenções diplomáticas, já que seu caráter é essencialmente científico. “É mais provável que as negociações sejam duras em relação às outras duas partes, particularmente a 3ª, que trata das ações de mitigação, que exigirão dos Estados uma maior redução de suas emissões de gases de efeito estufa.”

A diretora do Iddri destaca que “as três partes do relatório do IPCC são complementares e todas elas importantes”. Para Sénéchal, a 1ª parte pode ser encarada como um alicerce sobre o qual as demais vão se apoiar para oferecer uma compreensão dos riscos da mudança climática e de possíveis soluções.

O porta-vos do Greenpeace France lembra das cúpulas diplomáticas programadas até o final do ano, com destaque para a do G20, em outubro na Itália, que reunirá dirigentes dos países mais ricos e poluentes do planeta, antes da COP26 de Glasgow (de 1 a 12 de novembro), em que os Estados deverão rever suas metas em prol do clima.

No momento em que o planeta é marcado por catástrofes ambientais recentes em diferentes regiões, como as altas temperaturas no Canadá e as chuvas torrenciais que causaram inundações em parte da Europa e da Ásia, o Relatório de Avaliação do IPCC/ONU que será divulgado em 9 de agosto é um alerta a mais para a população dos 195 países.

Fontes: https://m.20minutes.fr/amp/a/3091895?fbclid=IwAR1JXIwpuQ2Da5kgqCl0MqJy7wPPIVqtMGaNQJTtGi_8G8dWT9VeLK6LSnY

https://phys.org/news/2021-03-impact-climate-siberia-permafrost.html

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