sexta-feira, 20 de julho de 2012

Competitividade Setorial: especialista condena deliberação do Conselho de Energias Renováveis

‘É uma posição equivocada e superficial [descartar certame para a contratação de usinas solares]’, diz Lisboa 

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Um dos 19 conselhos criados recentemente pelo governo federal no âmbito do Plano Brasil Maior, o de Competitividade Setorial de Energias Renováveis (CCSER), teve suas primeiras deliberações fortemente criticadas pelo engenheiro da Cemig, Alexandre Heringer Lisboa.

Em artigo publicado no site do GESEL (Grupo de Estudo do Setor de Energia Elétrica da UFRJ), Lisboa – renomado pesquisador e especialista em energias renováveis – contestou a argumentação do CCSER para não considerar a possibilidade de contratação de usinas solares em nosso país.

“Nenhuma política de inovação e competitividade se faz sem um investimento da sociedade. Se a inovação é incompleta é preciso incentivos e apoio do Governo e das empresas; se é completa, mas não trouxe a competitividade esperada, é porque a tecnologia não é a adequada à conjuntura vigente”, diz Lisboa.

Segundo Lisboa, outros países – com disponibilidade de radiação solar bem menor que a do Brasil (Alemanha, Espanha e China) – foram capazes de criar um moderno parque tecnológico e fazer com que o custo do investimento em módulos fotovoltaicos caísse abaixo de US$2,00 por “watt-pico” de capacidade instalada.

Segue o artigo, na íntegra. 

Conselho de Competitividade de Energia Renovável: um equívoco 

Por Alexandre Heringer Lisboa

Acertada e coerente com a sua visão desenvolvimentista, o governo federal lançou o Plano Brasil Maior, composto de 19 Conselhos de Competitividade Setoriais e nove Coordenações Sistêmicas. Segundo o Governo, o Plano “visa às ações de apoio à indústria, buscam fortalecer a competitividade, acelerar ganhos de produtividade, promover o adensamento produtivo e tecnológico das cadeias de valor, ampliar mercados, criar empregos de melhor qualidade e garantir um crescimento inclusivo e sustentável”. 

Pretende-se neste artigo analisar as primeiras deliberações do Conselho de Competitividade Setorial de Energias Renováveis, que foram publicadas na imprensa no início de Julho de 2012. Para todos os especialistas e agentes que atuam na área de energia renovável, as notícias que chegam foram uma ducha de água fria. Segundo publicado no site “Jornal da Energia”, de 05/07/12, a posição de Gilberto Houllauer, do MME, que preside tal Conselho, significam que o “governo ainda não está disposto a realizar um certame para a contratação de usinas solares” e que a ideia é afastada principalmente pela "possibilidade de impor um ônus adicional à sociedade", como a cobrança de alguns encargos e subsídios para custear a medida.

É uma posição equivocada e superficial. Primeiro é que nenhuma política de inovação e competitividade se faz sem um investimento da sociedade. Se tal tecnologia ainda não é competitiva é porque a inovação ainda não está completa e se a inovação é completa, mas não trouxe a competitividade esperada, é porque a tecnologia não é a adequada à conjuntura vigente. Por outro lado se a inovação é incompleta é preciso incentivos e apoio do Governo e das empresas. No Brasil ainda não há inovação, nem a competitividade e muito menos a tecnologia madura para a área da geração da energia elétrica de origem solar em escala comercial. Mas o Conselho deveria se perguntar, por que na Alemanha, Espanha, China e outros países que possuem um nível de radiação solar tão menor que o Brasil estão conseguindo implementar um moderno parque tecnológico e garantir uma demanda de consumo de módulos fotovoltaicos, que fez com que o custo da eletricidade solar reduzisse rapidamente atingindo valores abaixo de US$2,00/Wp e com viés de queda.

O nexo entre inovação e competitividade está totalmente incoerente, tornando o slogan “Inovar para competir. Competir para crescer” uma contradição em termos. Ao negar a competição tecnológica o governo nega a própria inovação. E os leilões de energia renovável promovidos pelo Governo foram forjados exatamente visando a redução de custos via competição. O exemplo das usinas eólicas que desafiaram toda essa lógica conservadora é um exemplo que demonstraram a real dinâmica da competitividade. Se fossem usar o mesmo argumento que o Conselho agora evoca, a energia eólica ainda estaria em patamares de competitividade muito aquém do que se verifica hoje. 

É correto o argumento de que não se pode querer impor um ônus à sociedade, mas trata-se somente de realocar e otimizar os ônus já colocados sobre a sociedade. Nestes termos, pode-se inferir que a decisão desse Conselho foi decepcionante. Frágil do ponto de vista técnico, superficial do ponto de vista econômico e pobre em fundamentação prática. Parte de premissas equivocadas e não considerou a dinâmica evolução da tecnologia solar nos últimos anos e a curva de aprendizado. É um raciocínio ex-ante e não ex-post como deveria ter toda a análise estratégica.

Outro ponto grave é que a posição do Conselho não levou em consideração que o Brasil, além dos mais ensolarados do mundo, possui 95% do quartzo do planeta (“A Mineração Brasileira”, J. Mendo Consultoria, 2009). Ao beneficiar esse quartzo e outros minerais de silício no território nacional, poderiam ser criadas as condições plenas para a implantação de uma indústria de transformação e agregação de valor à nossas matérias primas (1 kg de lascas de silício vale aproximadamente 1 dólar enquanto o silício de grau eletrônico atinge a faixa de 60-85 US$/kg (“J. Mendo Consultoria, 2009).

Mantida esta posição trata-se de uma grande oportunidade que está sendo desperdiçada pelo Governo Federal. Deveriam ter sido convidados técnicos mais especializados da área solar para subsidiar as discussões e considerado documentos técnicos existentes como, por exemplo, “Energia solar fotovoltaica no Brasil: subsídios para tomada de decisão”, publicado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) do próprio MCTI.

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