sábado, 7 de dezembro de 2019

COP 25: ‘neutralidade em carbono’ é meta da ONU para 2050

Organização reconhece insuficiência de ações em favor do clima e apresenta proposta para limitar aquecimento a 1,5 oC


A 25ª Conferência das Partes, inaugurada no último dia 2 em Madri, será capaz de impor aos países uma agenda dinâmica e ambiciosa de ações em prol do clima?

O balanço das ações preconizadas na Conferência da Partes de Paris em 2015 (COP 21) para conter as emissões de carbono é desalentador: quase todos os países signatários apresentam resultados aquém se suas metas.

“É preciso estabelecer marcos adequados, principalmente aos países do G20, responsáveis por 80% das emissões de carbono do mundo”, diz a ativista Lucile Dufour, do Réseau Action Climat (Rede Ação Clima).

Os compromissos assumidos há 4 anos pelos países participantes da COP 21 para limitar o aquecimento global “bem abaixo” dos 2 oC em relação à temperatura da era pré-industrial, se revelam insuficientes. Mantidas as atuais medidas para conter as emissões, o clima deve se aquecer além dos 3 oC até o final do século.

Agora, a Comissão Europeia propõe uma “aliança ambiciosa em favor do clima”, para engajar entidades governamentais ou não em ações visando uma neutralidade em carbono até 2050. Ou seja, num horizonte de 30 anos, a quantidade de gases de efeito estufa emitidos antropicamente deve ser igual à quantidade absorvida. Até o momento, 67 países aderiram. Mas estes não representam mais que 10% do total das emissões do planeta.

O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) publicou neste ano dois relatórios; um sobre as interações entre o clima e a superfície terrestre, outro sobre as interfaces oceano-criosfera.

Uma das conclusões desses relatórios, que expressam um amplo consenso científico, é que as emissões de carbono devem cair pela metade até o final da próxima década, para limitar a elevação de temperatura do planeta a 1,5 oC em relação ao registrado no final do século XIX.

“A COP 25 será uma conferência com chumbo nas asas”, declara a historiadora francesa Amy Dahan, logo após os Estados Unidos anunciar sua retirada do Acordo de Paris, há cerca de um mês.

De fato, a grande batalha não se dará entre os defensores de uma “ecologia liberal” (o neoliberalismo aplicado ao domínio ambiental) e aqueles que defendem uma “ecologia popular”, baseada em uma sociedade participativa e autogestionada.

O grande embate, que não vem de hoje, ocorre nas entranhas do capitalismo, entre os defensores dos combustíveis fósseis e aqueles que advogam pelas energias renováveis, embora a transição energética em prol de fontes limpas avance a passos largos.

A questão é saber se o ritmo dessa transição será suficientemente forte em nível global, para atender à crescente demanda de energia, especialmente na Ásia e na África.

Pela proposta da Comissão Europeia, o Green Deal, as emissões de carbono devem ser reduzidas entre 40% a 55% até 2030 em relação a 1990, o que não será factível sem uma aceleração da transição energética.

Mas no longo prazo, num horizonte além de 2050, não apenas o modelo energético deve ser alterado. É imperativo que as sociedades adotem um novo paradigma comportamental, pelo qual a cultura do consumismo dê lugar a um modo de vida que permita uma redução drástica das emissões de carbono.

Voltando aos possíveis engajamentos dos países em torno do Green Deal, um outro aspecto não menos importante precisa ser abordado ou reconsiderado. “O contexto geopolítico em torno da COP 25 obriga-os a relacionar justiça social com justiça climática, inclusive em escala internacional”, adverte Sara Lickel, do Secours Catholique Caritas France.

Isto significa recolocar na mesa uma questão presente em todas as convenções climáticas desde 1992: a responsabilidade histórica dos países mais industrializados, os maiores emissores de CO2 do planeta, que devem indenizar os países mais expostos aos efeitos do aquecimento global.

As nações mais desenvolvidas do globo se comprometeram em 2009, na Conferência de Copenhague, a disponibilizar 100 bilhões de dólares por ano, até 2020, para financiar a adaptação dos países em desenvolvimento para enfrentar as mudanças climáticas. Uma promessa longe de ser cumprida.

O relatório mais recente da OCED mostra que os recursos financeiros transferidos em 2017 aos países periféricos da economia mundial somam 71,2 bilhões (de US$), contra 58,6 bilhões em 2016. As novas contribuições anunciadas em setembro deste ano totalizam 9,8 bilhões.

“Os efeitos irreversíveis da desregulação climática, como a elevação do nível do mar, que avança sobre terras aráveis e moradias e desloca populações, impactam primeiramente nos países em desenvolvimento, os quais reclamam por maior ajuda financeira para reparar seus prejuízos”, diz Armelle Le Comte, da Oxfam France.

Esta associação francesa, braço da Oxfam Internacional -uma organização de combate à pobreza- estima entre 300 e 700 bilhões de dólares os recursos necessários para compensar tais prejuízos. Daí “a falta de vontade política dos países ricos, que fecham os olhos para este problema”, conclui Le Comte.

Acordos envolvendo tanto dinheiro são naturalmente difíceis, mas a urgência climática não pode esperar. Adeptos do neoliberalismo e da aplicação dos seus princípios na proteção do clima defendem os sistemas de troca de direitos de emissão de gases de efeito estufa entre os países mais emissores e aqueles que estão reduzindo suas emissões.

Na mesa de negociação da COP 25, estará o artigo 6 do Acordo de Paris, que prevê critérios para funcionamento do mercado de carbono, pelo qual um Estado possa comprar emissões equivalentes de CO2 evitadas por um outro Estado.

Mas será que a lógica do liberalismo econômico que norteia as políticas públicas das nações mais ricas será efetiva no combate às mudanças climáticas? Muitos especialistas dizem que não e propõem outros mecanismos para conter o avanço global das emissões de carbono, novas políticas de organização das atividades humanas, que respeitem mais a natureza e todos os seres vivos.

A politização da questão climática tem arrebatado mais e mais consciências e mobilizado multidões, especialmente na Europa. Se o papel dos governos que se fazem representar na COP 25 é inegavelmente importante, suas ações para proteger o clima só avançarão se respaldadas por amplas demandas da população.

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