domingo, 1 de dezembro de 2019

Clima: CO2 absorvido pela floresta Amazônica já é equiparável ao emitido em decorrência de fogo e seca, aponta estudo

Dados de satélite indicam que queimadas e períodos de seca neutralizam captura de carbono nos biomas tropicais

Mapa do desmatamento da Amazônia no século XXI (INPE 2019)

“Amazônia pulmão do mundo”? Nunca foi. Mas era sim um gigantesco sumidouro de CO2, resultante da fotossíntese de sua cobertura verde. Tudo indica que não é mais...

Um estudo publicado recentemente na revista Nature Plants sugere que as florestas nativas situadas entre os trópicos do planeta capturam tanto quanto emitem carbono.

A pesquisa analisou dados do satélite de observação terrestre em micro-ondas SMOS, como parte da missão CNES/ESA, no período de 2010 a 2017. São medidas da variação do CO2 atmosférico oriundos da cobertura vegetal em toda a zona tropical do planeta.

Lançado em 2009, o SMOS segue uma órbita a 755 km da Terra, passando pelos polos e captando informações em seu radar com uma resolução de 25 km x 25 km, que permitem avaliar a influência das florestas tropicais sobre a concentração de CO2 na atmosfera.

Os resultados apresentados no artigo Satellite-observed pantropical carbon dynamics mostram uma estreita dependência entre os estoques de carbono na vegetação aérea desses biomas e o CO2 atmosférico, confirmando a importância da biomassa vegetal dos ecossistemas tropicais no ciclo de carbono em escala planetária.

Atualmente, a ciência contabiliza um total de emissões atmosféricas que supera os 33 bilhões de toneladas de CO2 por ano. Este excesso de carbono no ar estaria alterando o clima, aquecendo o planeta.

Em condições normais, as florestas tropicais absorvem bilhões de toneladas de CO2 todo ano, ajudando a regular o clima e a manter a temperatura da Terra dentro de limites adequados para a vida.

O satélite SMOS enviou dados do balanço de CO2 sobre florestas situadas entre os trópicos de Câncer e Capricórnio nas Américas, África e Ásia, no período de 7 anos (2010-2017), que permitem correlacionar perdas de carbono à deflorestação.

O artigo da Nature Plants traz dois mapas: um com as perdas brutas de carbono da biomassa aérea; outro com as perdas da superfície vegetal relacionadas à deflorestação.

As imagens mostram claramente o Arco do Desmatamento na maior floresta tropical do mundo, a Amazônia, como também uma intensa atividade de deflorestação na Indonésia e em regiões equatoriais da África.

O estudo, realizado por 20 cientistas de diferentes países, estima uma perda anual de biomassa devida à destruição florestal em zonas tropicais de 780 milhões de toneladas de carbono.

Para o jornalista do Le Monde Sylvestre Huet, autor da matéria que enseja este post, o título “bem leve” do artigo da Nature Plants (Observações de Satélite da Dinâmica do Carbono Pantropical), sem proclamar resultados, revela uma prudência dos cientistas, que se explica pela duração relativamente curta do estudo e pela falta de dados sobre estoques de carbono no solo e nas raízes.

No entanto, os resultados mostram uma evolução preocupante. Se os biomas tropicais agem como sumidouros de carbono nos períodos úmidos, eles tornam-se neutros e até emissores em períodos de seca.

“A maioria dos modelos climáticos considera a floresta tropical como um sumidouro de carbono, mas certamente esses modelos subestimam o efeito da ocorrência repetida de secas”, diz um dos autores do trabalho, Philippe Ciais.

Por outro lado, um estudo recente da Nasa mostra que a deflorestação da Amazônia contribui para reduzir o teor de umidade na atmosfera local, criando um ambiente cada vez mais seco, deixando os ecossistemas mais vulneráveis aos incêndios.

A expansão das fronteiras agropecuárias por meio de queimadas é a maior responsável pela deflorestação amazônica. Mas não é a única causa da crescente aridez neste bioma. A alta concentração de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento atmosférico, estaria contribuindo na mesma proporção para o aumento das secas na região.

O estudo da Nasa analisou dados coletados no solo e imagens de satélite com registros da concentração de vapor d’água na atmosfera amazônica, permitindo avaliar a quantidade de umidade do ar necessária para manter os ciclos da floresta.

A região na qual o fenômeno do ressecamento atmosférico é mais acentuado é o sudeste da Amazônia, zona do Arco do Desmatamento, onde o avanço da fronteira agrícola é acelerado.

Entre agosto de 2018 e julho de 2019 a Amazônia perdeu cerca de 10 mil km2 de floresta, quase 30% a mais que nos 12 meses anteriores, o maior avanço já registrado de um ano para o outro nos últimos 22 anos.

Para o climatologista Carlos Nobre, o estudo da Nasa confirma o que outros estudos já indicavam. Uma área da Amazônia de 2 milhões de km2 está se tornando mais quente e mais seca, prolongando a estação seca entre 3 e 4 semanas além do seu período normal, diz o pesquisador do IEA/USP.

A floresta Amazônica está se convertendo rapidamente em uma savana tropical, que é “o bioma de equilíbrio com uma longa estação de seca e fogo”, explica Nobre.

“O ponto de não retorno está bem próximo”. Com o desmatamento acelerado e a continuidade do aquecimento global, a savanização da Amazônia acontecerá daqui há 15 ou no máximo 30 anos, conclui Nobre.

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