Após três edições bienais – Barcelona (2005), Porto (2007) e Castellón (2009) – a capital espanhola vai sediar a partir de amanhã o IV Congresso Iberoamericano de Ciências e Técnicas do frio (CYTEF, na sigla em espanhol). Este blogueiro participa do evento.
Nos próximos três dias, cientistas, estudantes, docentes e empresários vão discutir vários aspectos da produção de frio, abrangendo seis áreas temáticas.
São elas: (1) termodinâmica e transferência de calor; (2) sistemas de refrigeração e bombas de calor; (3) aplicações industriais do frio, conservação, estocagem e transporte de produtos perecíveis; (4) ar condicionado; (5) criofísica, criogenia e criobiologia; e (6) ensino da tecnologia frigorífica.
Importância das tecnologias do frio
As tecnologias de refrigeração e ar condicionado têm contribuído com o desenvolvimento socioeconômico de boa parte da população mundial, já que propiciam a conservação de alimentos, medicamentos, vacina e sangue, e também conforto ao ser humano. Têm grande impacto na matriz energética de um país, principalmente em relação ao consumo elétrico.
O Brasil possui uma importante indústria do frio, cujo mercado movimenta uma dezena de bilhões de reais por ano. Parte expressiva desse potencial econômico se deve à produção de frutas e hortaliças, a qual está imbricada a uma cadeia do frio (armazenagem, transporte, distribuição e vendas), que por sua vez depende de equipamentos confiáveis e eficazes.
A cadeia do frio aqui é muito mais voltada para a exportação, devido às maiores distâncias envolvidas, ao maior valor dos perecíveis e às exigências sanitárias dos países importadores. Já no mercado interno, essa cadeia geralmente é “quebrada”, pelo não cumprimento de todas as etapas necessárias para manter a vida útil do produto, principalmente de frutas, que após a distribuição são armazenadas à temperatura ambiente.
Esta vulnerabilidade acarreta sérios prejuízos ao país e poderia ser mitigada pelo uso de equipamentos mais eficazes e baratos e/ou sistemas de produção de frio alternativos que apresentem boa relação custo/benefício.
Como funcionam
Entre os diferentes métodos para gerar efeito frigorífico (dissolução de solutos, fusão, vaporização, sublimação, expansão gasosa, efeito termoelétrico, desmagnetização e efeito termoacústico), a evaporação de um fluido é o mais utilizado.
O equipamento frigorífico usual é um dispositivo capaz de deslocar de modo cíclico um “fluido refrigerante” – que ora se evapora (produzindo frio), ora se condensa (dissipando calor na atmosfera) – e, assim, manter um dado espaço mais frio que o ar externo.
Geração de frio e sustentabilidade
Se a energia primária que gera a eletricidade que alimenta refrigeradores e condicionadores de ar for de origem fóssil, a produção de frio implica na liberação de CO2 para a atmosfera. Quanto mais eficiente o equipamento, maior é a relação entre o frio gerado e o calor despejado na atmosfera.
Nos Estados Unidos, entre 1960 e 1990, o desempenho dos refrigeradores aumentou em média 30%, e mais 15% até 2005. Já nos equipamentos de ar condicionado o desempenho cresceu em média 44%, de 1975 a 2005, o que significou evitar a emissão de 10 milhões de toneladas de CO2.
Em termos globais, para cada unidade de energia elétrica que ingressa num equipamento frigorífico três unidades de calor são retiradas do espaço a esfriar e quatro são transferidas ao meio ambiente. Neste caso, o rendimento global do ciclo combinado termelétrico/refrigeração é próximo a 1.
Produzindo frio a partir de calor
Uma alternativa tecnológica já comercialmente viável em alguns países é a “refrigeração térmica”, baseada em ciclos de sorção, cujo consumo elétrico é mínimo. Este tipo de equipamento funciona a base de calor, fornecido normalmente pela queima de gás; o movimento do fluido ocorre por diferença de pressão.
Se a eletricidade consumida for de origem térmica e a usina próxima ao centro de produção de frio, é possível conceber um sistema de “trigeração”, que produza simultaneamente calor, eletricidade e frio, com alto rendimento global.
Ar condicionado no Brasil
Refrigerar ambientes para prover conforto térmico gera um impacto importante em nossa matriz elétrica, como mostram alguns dados.
O consumo elétrico de equipamentos de ar condicionado na indústria têxtil e em prédios comerciais é de 40% do total; nos aeroportos chega a 50% e em shoppings e bancos a energia gasta em climatização supera os 70% do total consumido.
No Brasil, o consumo energético das edificações é extremamente alto devido, entre outros fatores, à falta de critérios de eficiência térmica na escolha dos materiais de revestimento. Só recentemente foi instituída uma certificação neste sentido (RTQ-R, do Inmetro), cujo objetivo principal é fomentar a adoção de estratégias de eficiência energética nas construções.
No Nordeste, a “carga térmica” (energia que deve ser dissipada do recinto para prover conforto aos seus ocupantes) é de 200 W/m2 de área de planta, enquanto que nas ecobuildings (edificações energeticamente eficientes) da Europa o consumo é de 50 W/m2, incluindo a energia gasta na calefação invernal.
O frio que vem do sol
Por ser um país tropical (quase todo território entre os trópicos de Capricórnio e de Câncer), a maior parcela da energia solar responsável pelo aquecimento excessivo das edificações brasileiras incide nos telhados, especialmente para edificações horizontais.
Mas os telhados podem ser usados também para captar os raios solares que, por sua vez, podem acionar sistemas de climatização baseados em ciclos de refrigeração térmica.
Para aquecimento de água, a energia solar já é razoavelmente utilizada (são 6,2 milhões m2 de coletores solares instalados em território nacional), mas temos uma disponibilidade de sol suficiente para ampliar sensivelmente a área instalada.
Pode-se dizer que produzir frio é uma das aplicações mais interessantes da energia solar, já que quanto mais ensolarado o lugar, maior a demanda por refrigeração e ar condicionado.
É com base nesta ideia que um grupo de pesquisa do Laboratório de Energia Solar da UFPB, Campus de João de Pessoa, coordenado por este blogueiro, desenvolve o projeto – pioneiro na América Latina – de um ar condicionado, cujo insumo energético principal é a radiação solar (figura).
O protótipo, que se encontra parcialmente instalado, dispõe de um campo de coletores solares planos de alto rendimento (área total de captação de 120 m2) e um chiller (unidade resfriadora de água) de adsorção, que utiliza carvão ativado e metanol (fluido refrigerante), entre outros componentes.
O sistema foi dimensionado para operar com até 75% de energia solar, o restante sendo fornecido por um pequeno aquecedor a gás, capaz ainda de garantir o funcionamento do ar condicionado em dias nublados ou chuvosos. A instalação vai climatizar quatro salas de laboratório, com área de planta total de 110 m2.
No CYTEF 2005, este blogueiro apresentou o pré-projeto do ar condicionado solar do LES/UFPB. Nesta edição, vai expor detalhes construtivos do equipamento e o consumo de gás durante um dia típico de cada mês – resultante de simulação computacional – baseado em dados meteorológicos de João Pessoa.
O Brasil possui uma importante indústria do frio, cujo mercado movimenta uma dezena de bilhões de reais por ano. Parte expressiva desse potencial econômico se deve à produção de frutas e hortaliças, a qual está imbricada a uma cadeia do frio (armazenagem, transporte, distribuição e vendas), que por sua vez depende de equipamentos confiáveis e eficazes.
A cadeia do frio aqui é muito mais voltada para a exportação, devido às maiores distâncias envolvidas, ao maior valor dos perecíveis e às exigências sanitárias dos países importadores. Já no mercado interno, essa cadeia geralmente é “quebrada”, pelo não cumprimento de todas as etapas necessárias para manter a vida útil do produto, principalmente de frutas, que após a distribuição são armazenadas à temperatura ambiente.
Esta vulnerabilidade acarreta sérios prejuízos ao país e poderia ser mitigada pelo uso de equipamentos mais eficazes e baratos e/ou sistemas de produção de frio alternativos que apresentem boa relação custo/benefício.
Como funcionam
Entre os diferentes métodos para gerar efeito frigorífico (dissolução de solutos, fusão, vaporização, sublimação, expansão gasosa, efeito termoelétrico, desmagnetização e efeito termoacústico), a evaporação de um fluido é o mais utilizado.
O equipamento frigorífico usual é um dispositivo capaz de deslocar de modo cíclico um “fluido refrigerante” – que ora se evapora (produzindo frio), ora se condensa (dissipando calor na atmosfera) – e, assim, manter um dado espaço mais frio que o ar externo.
http://www.sanicheckonline.com/noticias-cadena-frio-garantiza-seguridad-alimentaria
Geração de frio e sustentabilidade
Se a energia primária que gera a eletricidade que alimenta refrigeradores e condicionadores de ar for de origem fóssil, a produção de frio implica na liberação de CO2 para a atmosfera. Quanto mais eficiente o equipamento, maior é a relação entre o frio gerado e o calor despejado na atmosfera.
Nos Estados Unidos, entre 1960 e 1990, o desempenho dos refrigeradores aumentou em média 30%, e mais 15% até 2005. Já nos equipamentos de ar condicionado o desempenho cresceu em média 44%, de 1975 a 2005, o que significou evitar a emissão de 10 milhões de toneladas de CO2.
Em termos globais, para cada unidade de energia elétrica que ingressa num equipamento frigorífico três unidades de calor são retiradas do espaço a esfriar e quatro são transferidas ao meio ambiente. Neste caso, o rendimento global do ciclo combinado termelétrico/refrigeração é próximo a 1.
Produzindo frio a partir de calor
Uma alternativa tecnológica já comercialmente viável em alguns países é a “refrigeração térmica”, baseada em ciclos de sorção, cujo consumo elétrico é mínimo. Este tipo de equipamento funciona a base de calor, fornecido normalmente pela queima de gás; o movimento do fluido ocorre por diferença de pressão.
Se a eletricidade consumida for de origem térmica e a usina próxima ao centro de produção de frio, é possível conceber um sistema de “trigeração”, que produza simultaneamente calor, eletricidade e frio, com alto rendimento global.
Ar condicionado no Brasil
Refrigerar ambientes para prover conforto térmico gera um impacto importante em nossa matriz elétrica, como mostram alguns dados.
O consumo elétrico de equipamentos de ar condicionado na indústria têxtil e em prédios comerciais é de 40% do total; nos aeroportos chega a 50% e em shoppings e bancos a energia gasta em climatização supera os 70% do total consumido.
No Brasil, o consumo energético das edificações é extremamente alto devido, entre outros fatores, à falta de critérios de eficiência térmica na escolha dos materiais de revestimento. Só recentemente foi instituída uma certificação neste sentido (RTQ-R, do Inmetro), cujo objetivo principal é fomentar a adoção de estratégias de eficiência energética nas construções.
No Nordeste, a “carga térmica” (energia que deve ser dissipada do recinto para prover conforto aos seus ocupantes) é de 200 W/m2 de área de planta, enquanto que nas ecobuildings (edificações energeticamente eficientes) da Europa o consumo é de 50 W/m2, incluindo a energia gasta na calefação invernal.
O frio que vem do sol
Por ser um país tropical (quase todo território entre os trópicos de Capricórnio e de Câncer), a maior parcela da energia solar responsável pelo aquecimento excessivo das edificações brasileiras incide nos telhados, especialmente para edificações horizontais.
Mas os telhados podem ser usados também para captar os raios solares que, por sua vez, podem acionar sistemas de climatização baseados em ciclos de refrigeração térmica.
Para aquecimento de água, a energia solar já é razoavelmente utilizada (são 6,2 milhões m2 de coletores solares instalados em território nacional), mas temos uma disponibilidade de sol suficiente para ampliar sensivelmente a área instalada.
Pode-se dizer que produzir frio é uma das aplicações mais interessantes da energia solar, já que quanto mais ensolarado o lugar, maior a demanda por refrigeração e ar condicionado.
É com base nesta ideia que um grupo de pesquisa do Laboratório de Energia Solar da UFPB, Campus de João de Pessoa, coordenado por este blogueiro, desenvolve o projeto – pioneiro na América Latina – de um ar condicionado, cujo insumo energético principal é a radiação solar (figura).
Esquema simplificado do ar condicionado solar do LES/UFPB
O protótipo, que se encontra parcialmente instalado, dispõe de um campo de coletores solares planos de alto rendimento (área total de captação de 120 m2) e um chiller (unidade resfriadora de água) de adsorção, que utiliza carvão ativado e metanol (fluido refrigerante), entre outros componentes.
O sistema foi dimensionado para operar com até 75% de energia solar, o restante sendo fornecido por um pequeno aquecedor a gás, capaz ainda de garantir o funcionamento do ar condicionado em dias nublados ou chuvosos. A instalação vai climatizar quatro salas de laboratório, com área de planta total de 110 m2.
No CYTEF 2005, este blogueiro apresentou o pré-projeto do ar condicionado solar do LES/UFPB. Nesta edição, vai expor detalhes construtivos do equipamento e o consumo de gás durante um dia típico de cada mês – resultante de simulação computacional – baseado em dados meteorológicos de João Pessoa.
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